Bares tradicionais de coquetelaria de São Paulo registram nesta 6ª feira (3.out.2025) baixa movimentação e queda nas vendas de destilados por causa do medo de intoxicação por metanol, segundo apurou o Poder360.
O Riviera, na Consolação, um dos pontos mais frequentados por apreciadores de coquetéis, e o Bottega 21, no bairro nobre de Pinheiros, estimam uma queda superior a 80% no consumo de drinks à base de cachaça, gim, vodca e uísque. Já o SubAstor, na Vila Madalena, também relata prejuízo: nos últimos dias, atende em torno de 5% da quantidade de clientes habituais.
Em todos esses locais, os clientes deixaram de lado as bebidas destiladas para privilegiar as fermentadas, como cerveja e vinho. O motivo, dizem, é a precaução. “Prefiro destilado, mas fui pela cerveja para garantir”, afirma a estudante de direito Isabela, 23 anos, com um copo de chopp na mão no balcão do Riviera. “Confio no bar, sei que é tudo de qualidade, mas é muito recente, a gente não sabe o que pode acontecer.”
A algumas cadeiras ao lado, as funcionárias administrativas Andreza, 26 anos, e Laísa, 27 anos, também bebem chopp com medo da contaminação por metanol. “Não costumamos tomar cerveja aqui, mas preferimos não arriscar”, diz Laísa.
Daniel Gomes e Fabio Cardoso, responsáveis pela operação do Riviera, acreditam que o consumo dos chopps e vinhos aumentou em 20%, mas o valor não compensa a queda drástica do comércio de drinks. “Somos uma casa que concentra as vendas na coquetelaria e agora temos uma queda diária de mais ou menos 80% neles”, disse Gomes.
A situação é parecida com a do Bottega 21. O dono e mixologista Michel Felício afirma que até as 21h desta 6ª feira (3.out) havia vendido só 1 drink com destilado. Em uma semana comum, teria vendido mais de uma centena. “Tivemos que dispensar alguns funcionários do trabalho de hoje porque sabíamos que não teria movimento”, declara.
A casa esperava receber uma mesa de 50 pessoas, mas a cliente cancelou de última hora. A justificativa, segundo a funcionária responsável pelas reservas, foi o medo de contaminação por metanol.
O bar de drinks SubAstor retrata bem a preocupação dos clientes. No andar de cima, onde funciona o bar que foca no comércio de cervejas, dezenas de clientes consumiam a bebida fermentada às 19h de 6ª feira (3.out). Já no andar de baixo, o da coquetelaria, estava vazio.
“É uma diferença gigante”, afirma uma das coordenadoras, que preferiu não se identificar. Segundo ela, na 4ª feira (1º.out), data em que os casos de intoxicação por metanol foram amplamente divulgados, o bar atendeu cerca de 5% do que o de costume. No dia seguinte, “foi ainda pior”. A expectativa era que as reservas da noite desta 6ª feira (3.out) não fossem canceladas, o que asseguraria um pequeno aumento da clientela.
Os sócios e gerentes dos bares esperam para que a diminuição de vendas seja temporária e estudam medidas para trazer de volta os clientes ao bar. Daniel Gomes, do Riviera, planeja colocar uma placa com os certificados de segurança na porta do estabelecimento. Fabio Cardoso, do mesmo bar, crê que a comunicação pelas redes sociais também ajudará a esclarecer às pessoas que todas as bebidas da casa são homologadas e seguras para consumo.
O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, recomendou na 5ª feira (2.out) que a população evite o consumo de destilados sem “absoluta certeza da origem”, sobretudo os incolores, nos quais já foi identificada adulteração com metanol.
Nesta 6ª feira (3.out), o Ministério da Saúde informou que o Brasil tem 113 notificações de intoxicação por bebida adulterada com metanol desde agosto, sendo 11 casos confirmados em São Paulo. Há uma morte confirmada em São Paulo e 11 estão sob análise.
As suspeitas (que precisam de um laudo para serem confirmadas) estão divididas da seguinte forma:
Às 17h16, a Secretaria de Saúde de São Paulo notificou outro caso sob investigação, elevando para 91 o total de registros no Estado.
O Ministério da Saúde informou que os dados sobre intoxicações por metanol relacionadas ao consumo de bebidas alcoólicas passarão a ser atualizados, às 17h. As informações serão divulgadas depois da consolidação das notificações enviadas pelos CIEVS (Centros de Informações Estratégicas e Resposta em Vigilância em Saúde) estaduais e nacional.
Segundo o ministério, as mortes investigadas estão distribuídas da seguinte forma:
O metanol, também conhecido como álcool metílico (CH₃OH), é uma substância química altamente tóxica, volátil e inflamável. Trata-se de um álcool simples, incolor, de odor semelhante ao da bebida alcoólica comum. No passado, era chamado de “álcool da madeira” por ser obtido da destilação de toras. Hoje, é produzido em escala industrial, sobretudo a partir do gás natural.
O líquido é usado como matéria-prima para a produção de formaldeído, ácido acético, resinas, solventes e tintas. Também está presente em anticongelantes, limpa-vidros e removedores de tinta. No Brasil, uma das principais aplicações é na produção de biodiesel, por meio da transesterificação.
A ingestão de 4 ml a 10 ml de metanol pode causar danos irreversíveis, como a cegueira, segundo o CFQ (Conselho Federal de Química). O conselho alerta que pequenas doses já representam uma ameaça real à vida. Estima que 30 ml de metanol puro podem ser letais.
O perigo maior da ingestão de metanol aparece nos efeitos tardios, afirma o Conselho Federal de Química. O metanol é metabolizado no organismo em formaldeído e ácido fórmico, este último responsável por causar acidose metabólica — um grave desequilíbrio do pH sanguíneo. Os sintomas incluem:
De acordo com a Abno (Associação Brasileira de Neuro-oftalmologia), o diagnóstico deve ser feito a partir da história clínica do paciente e por exames de sangue e de imagem.
Em caso de suspeita de ingestão ou contato prolongado com metanol, não induza o vômito e encaminhe a pessoa com urgência para o hospital. Quanto mais cedo forem realizados o diagnóstico e o tratamento, menor é o risco de morte ou de sequelas graves.
O tratamento é feito com medicamentos intravenosos (fomepizol) que, assim como o etanol, podem inibir o metabolismo do metanol, evitando a formação do ácido fórmico, causador das sequelas mais graves. O paciente pode ser submetido à lavagem gástrica e hemodiálise.
Segundo o Conselho Federal de Química, o problema surge quando o metanol é usado de forma criminosa na adulteração de bebidas alcoólicas.
A ingestão, inalação ou contato prolongado com o metanol pode provocar sintomas imediatos, como náusea, tontura, vômito e depressão do sistema nervoso central.
Para evitar intoxicações, recomenda-se:
A fiscalização rigorosa de órgãos governamentais e as análises laboratoriais periódicas feitas por profissionais da química são essenciais para prevenir tragédias. Eles têm o papel de identificar contaminantes, garantir a qualidade dos produtos e conscientizar a população sobre os riscos do consumo de bebidas adulteradas.