Os CEOs da GOL e da Latam afirmaram nesta 2ª feira (20.out.2025) que o setor aéreo brasileiro vive uma fase de crescimento acelerado, com demanda sólida e retomada de capacidade após anos de estagnação.
Contudo, o segmento ainda enfrenta custos elevados e insegurança regulatória que ameaçam a expansão de longo prazo.
“Sabemos que o mercado brasileiro pode ter um bom 2025 e, provavelmente, um bom 2026. Mas os efeitos da política fiscal atual no Brasil devem aparecer em 2027 e 2029. Então, veremos o que acontece depois de 2027, o que ainda é motivo de atenção”, declarou durante a 21ª Assembleia Geral da Alta (Associação de Transporte Aéreo da América Latina e do Caribe).
O executivo da GOL, Celso Ferrer, detalhou os principais obstáculos enfrentados pelas companhias aéreas no país.
“Ser uma companhia aérea no Brasil significa não ter acesso fácil a linhas de crédito nos Estados Unidos, por exemplo, o que nos deixa expostos a tudo. No nosso caso, 95% da dívida está em dólares. E o que temos em reais? Taxas de juros muito altas”, disse.
Ele destacou ainda o impacto dos litígios e tributos sobre o setor.
“São mais de um bilhão de reais, o equivalente a US$ 250 a 300 milhões, que as companhias aéreas pagam por ano em processos judiciais”, afirmou.
Segundo a Abear (Associação Brasileira das Empresas Aéreas), 98,5% de todas as ações judiciais contra companhias aéreas no mundo estão concentradas no Brasil. Leia a íntegra do estudo (PDF – 1 MB).
Ferrer também citou a estrutura tributária.
“O grande elefante na sala agora são os impostos. Pagamos imposto retido sobre vistos, algo inexistente em outros países. Temos também o IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), que impacta todos os pagamentos ao exterior. Imagine: a maior parte das receitas em reais, mas todos os pagamentos a fornecedores internacionais com um acréscimo de 3,5% de IOF”, declarou.
Segundo ele, a questão tributária não foi discutida com o setor.
“Isso entrou em vigor de uma hora para outra. Essa instabilidade tributária e a incerteza sobre a reforma fiscal afetam diretamente o setor”, completou.
O diretor da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), Luiz Ricardo de Souza Nascimento, afirmou que o órgão está reformulando sua atuação regulatória e auxiliando na estruturação de programas que visam atrair investimentos para aeroportos e melhorar a infraestrutura –entre eles, o AmpliAr.
“Estamos mudando nossos regulamentos, adotando um modelo menos prescritivo, que chamamos de regulação responsável. Isso vai impactar nossa capacidade de fiscalização, porque será orientada por dados e pelo comportamento e desempenho dos operadores”, disse.
“O outro pilar [para melhorar o setor], naturalmente, é a infraestrutura […] O objetivo é atrair mais investidores para o Brasil, especialmente para os aeroportos, de modo a acomodar o crescimento que estamos enfrentando agora”, completou.
Tanto Ferrer quanto Cadier defenderam que o Brasil tem um dos mercados mais concorridos da aviação mundial, contrariando críticas sobre falta de competição.
Atualmente, apenas 3 empresas operam voos domésticos (dentro do país) no Brasil.
“Os dados mostram outra realidade: em 70% da demanda do país, as três companhias voam nas mesmas rotas. E se considerarmos as O&Ds (origem e destino), como Porto Alegre–Recife (em que a Azul opera via Campinas, e Latam e GOL via Guarulhos e Rio), esse número sobe para 90%”, disse Ferrer.
“Ou seja, 90% da demanda total tem três opções de companhia. Poucos mercados no mundo, mas certamente na América do Sul, têm esse nível de concorrência”, completou.
Um dos pontos mais sensíveis debatidos no painel foi a instabilidade regulatória, exemplificada pelo projeto de lei em tramitação no Congresso que pode proibir a cobrança por bagagens de mão.
Cadier defendeu que as tarifas segmentadas são positivas para o consumidor e alinhadas ao padrão internacional.
“No Brasil, nunca tivemos esse tipo de tarifa, em parte por causa da incerteza regulatória. […] A ideia é dar ao passageiro a opção de pagar menos se não quiser usar o compartimento superior. É algo positivo para o consumidor, ela amplia o acesso a tarifas mais baratas e estimula a demanda”, afirmou.
No entanto, reconhece que a modalidade não foi comunicada corretamente aos consumidores.
“Infelizmente, isso foi mal interpretado como se as companhias estivessem ‘cobrando pelo uso do compartimento’, quando, na verdade, trata-se de dar opções diferentes ao cliente. Reconhecemos que não comunicamos bem isso ao público”, disse.