O STF (Supremo Tribunal Federal) retomará nesta 4ª feira (4.jun.2025) o julgamento sobre a responsabilização das redes sociais pelos conteúdos publicados por usuários. Para o ministro decano do Supremo, Gilmar Mendes, a retomada da análise significa uma nova chance para que o país debata a regulação das plataformas digitais.
O julgamento será de duas ações (leia mais abaixo) sobre o artigo 19 do Marco Civil da Internet (Lei 12.965 de 2014). A decisão nos 2 casos é sobre a obrigação das plataformas removerem conteúdos considerados ofensivos publicados por usuários sem que seja necessária a sentença judicial. A lei determina que essa obrigação vale só para casos de violação de direitos autorais e para a divulgação de fotos íntimas sem consentimento.
Para o ministro decano, uma janela de oportunidade foi desperdiçada com o fracasso da PL das Fake News. Em entrevista ao jornal O Globo publicada nesta 4ª feira, Gilmar disse que houve “jogo pesado” das plataformas nos bastidores para impedir a tramitação do projeto de lei e que a retomada do debate pelo STF deve servir como estímulo para que os demais Poderes também analisem o tema.
“Isso não pode se exaurir em uma decisão do tribunal. Terá de haver decisão legislativa e também medidas administrativas, órgãos que eventualmente possam dialogar com as plataformas e que tenham subsídios técnicos para isso. Não se pode esperar que só o Supremo dê resposta. Estamos falando de coisas extremamente complexas e que demandam a estruturação de um órgão [dedicado ao tema]”, disse.
Gilmar ainda não votou no julgamento, interrompido em dezembro de 2024 após pedido de vistas (mais tempo para análise) pelo ministro André Mendonça. Ele rechaça a ideia de que a regulamentação das redes seja equivalente à censura e defende que haja um “mecanismo de coordenação”.
“Regular não tem nada a ver com compromissos antidemocráticos, com censura. Pelo contrário. Todo mundo sabe que a plataforma não evita que se coloque alguma coisa imprópria (nas redes). Mas, verificado aquilo, e hoje os meios de verificação existem, o que se quer é que haja algum tipo de medida de coordenação. Portanto, não se trata de afetar a liberdade de expressão ou estabelecer um órgão censório”, declarou.
Gilmar citou a Europa como exemplo no assunto, afirmando que o modelo de regulamentação de plataformas digitais implementado na União Europeia pode ser adaptado ao Brasil.
“Ninguém vai dizer que a Alemanha é antidemocrática. Ninguém vai dizer que a União Europeia, com 27 países, têm propósitos antidemocráticos. Não obstante, eles estão regulando”, afirmou Gilmar.
O julgamento voltará com o voto do ministro André Mendonça, que pediu vista em dezembro de 2024. A análise definirá como as empresas donas das plataformas devem agir quando seus usuários publicarem conteúdos considerados ilegais. Os ministros discutem a validade do artigo 19 do Marco Civil da Internet.
O artigo 19 estabelece que as redes sociais só poderão ser responsabilizadas por conteúdo postado se deixarem de cumprir decisão de juiz para remoção. Portanto, sem determinação judicial, não há responsabilização.
Há votos para a obrigação de remoção de conteúdo mesmo sem decisão judicial de 3 dos 11 ministros do STF: Dias Toffoli, Luiz Fux e Luís Roberto Barroso (o presidente abriu divergência em seu entendimento –leia um resumo dos votos mais abaixo). Eles dizem que o artigo 19 é inconstitucional porque a manutenção de conteúdo ofensivo pelas redes sociais, mesmo provisoriamente, prejudica direitos.
Em seu voto, Fux defendeu que conteúdos considerados ilícitos ou ofensivos devem ser removidos assim que as plataformas forem notificadas. O objetivo seria evitar que determinados posts viralizem.
Plataformas como Facebook, Instagram e X têm a opção “denunciar” em seus posts. Até o momento, não se sabe se bastará que o usuário ofendido notifique a plataforma para a publicação ser excluída. Também não se sabe quem definiria se uma postagem deve ou não ser apagada.
Para o Google, corre-se o risco de haver um excesso de precaução: as plataformas passariam a derrubar todo e qualquer tipo de conteúdo questionável.
“Qualquer matéria de jornalismo investigativo poderia ser removida, porque algumas pessoas argumentariam que a denúncia não está comprovada e que se sentem caluniadas. O jornalismo investigativo é muito importante para nossa democracia”, avalia Fábio Coelho, CEO do Google Brasil.
As redes sociais são contrárias à obrigação de remover conteúdo antes de uma ordem judicial. O principal argumento de defesa das empresas é que há risco de ambiguidade sobre o que é ofensivo.
Representantes de redes sociais afirmam que há 2 riscos se o STF determinar que as redes sociais devem avaliar exclusão de conteúdo ofensivo:
Toffoli e Fux defenderam a remoção obrigatória de conteúdo de usuários em casos específicos.
Barroso abriu divergência e votou pela manutenção parcial do artigo. Argumenta que em situações em que há a acusação de crime contra a honra (injúria, calúnia e difamação), a remoção do conteúdo só deve ocorrer depois de ordem judicial. De acordo com o presidente da Corte, seria uma forma de preservar a liberdade de expressão.
Leia abaixo como votaram os ministros:
Ainda faltam votar André Mendonça, Flávio Dino, Nunes Marques, Cármen Lúcia, Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Edson Fachin e Cristiano Zanin.