As defesas dos réus Ailton Moraes Barros, Ângelo Denicoli e Carlos César Moretzsohn Rocha, que integram o núcleo 4 da denúncia de golpe de Estado, pediram na manhã desta 3ª feira (14.out.2025) a absolvição por “falta de provas”. Os advogados declararam que houve um ataque ao STF (Supremo Tribunal Federal) de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), mas alegaram que seus clientes não atuaram em grupo criminoso.
O núcleo, classificado pela PGR (Procuradoria Geral da República) como o da “desinformação”, é formado por militares da ativa e da reserva do Exército, além de policiais federais. Eles são acusados de articular a propagação de notícias falsas sobre o processo eleitoral e de promover ataques virtuais a instituições e autoridades.
Nas sustentações orais durante o julgamento núcleo 4 na 1ª Turma do STF, as defesas contrapuseram os argumentos da acusação, buscando afastar a participação individual dos réus Ailton Moraes Barros, Ângelo Denicoli e Carlos César Moretzsohn Rocha. A PGR pediu a condenação de todos. Para o julgamento do grupo, estão marcadas sessões em 14,15, 21 e 22 de outubro.
Eis os principais argumentos:
Segundo as alegações finais da PGR (Procuradoria Geral da República), o ex-major do Exército seguiu ordens do general Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil e da Defesa do governo Bolsonaro. Ele teria coordenado campanhas contra militares e outras pessoas que resistiram ao golpe de Estado, incluindo o ex-comandante do Exército Freire Gomes e o ex-comandante da Aeronáutica Baptista Júnior.
O defensor público da União Gustavo Zortéa da Silva declarou que não há provas suficientes para a condenação do réu. Ele relembrou os depoimentos de Freire Gomes e Baptista Júnior, e declarou que ambos disseram não ter recebido mensagens diretas ou encaminhadas do réu.
Segundo a defesa, Barros mandou uma mensagem a Braga Netto por engano. Ao ser respondido, manteve o contato com o general porque queria conseguir apoio para uma carreira política. O defensor público argumentou que o ex-major do Exército “precisou se reinventar” após ser expulso do Exército em 2008 por denunciar o racismo que sofreu, o que culminou numa candidatura a deputado estadual em 2022.
O defensor público também citou a delação do tenente-coronel Mauro Cid. “Ele deixa claro que Ailton não teve influência no governo Bolsonaro. Que foi ‘descanteado’, ou escanteado, devido a problemas progressos na carreira militar. Disse que não tem nenhum poder de influência sobre o Exército, e que não teve nenhuma conversa com ele sobre plano, articulação e ataque a autoridades”, declarou a defesa.
Silva argumentou que não houve comprovação de que o réu coordenasse campanha contra os comandantes do Exército, e pediu que o réu fosse absolvido. “A acusação não reuniu provas suficientes para realizar a condenação”, finalizou.
A acusação afirma que o major da reserva Angelo Denicoli articulou com o então diretor-geral da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), Alexandre Ramagem, a produção de materiais falsos sobre o processo eleitoral, com o objetivo de “propiciar o crescimento do sentimento de desconfiança da população e favorecer a ruptura institucional”.
Para o advogado Zoser Plata Bondim Hardman de Araújo, as provas apresentadas pela PGR não comprovam a participação efetiva do militar na organização criminosa. Segundo a defesa, as imputações são genéricas: “Ele não teve qualquer atuação ativa que pudesse indicar que ele soubesse ou que teria contribuído para atos criminosos, para justificar a sua inclusão nesse contexto”.
Segundo a PGR, Denicoli produziu um relatório com informações falsas sobre o processo eleitoral e articulou a divulgação com o influenciador argentino Fernando Cerimedo, autor de live de 4 de novembro em que questiona as urnas eletrônicas.
O advogado argumentou que não foi demonstrada uma vinculação direta entre o militar e Cerimedo: “Ele acessou uma pasta do Google Drive e encaminhou um telefone, isso é suficiente para uma convicção de que Ângelo teria algum tipo de participação na live do dia 4 de novembro?”.
Engenheiro e presidente do Instituto Voto Legal, Moretzsohn Rocha foi contratado pelo PL para prestar serviços de auditoria das urnas eletrônicas em 2022. Para a PGR, ele sabia das inconsistências das alegações de fraudes, mas teria vazado um documento que serviu para pedido do PL ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral), para falar que algumas urnas teriam “erros na leitura dos votos”.
O advogado Melillo Dinis do Nascimento disse que seu cliente apenas cumpriu um “papel técnico” no aspecto da auditoria, como um “médico que realiza um check-up anual”. Argumentou que o contrato firmado com o PL tinha uma cláusula de exclusividade e de direito autoral. “A divulgação pública de conclusões e interpretações políticas nunca lhe coube”, afirmou. Segundo ele, o material pertencia ao partido, e não foi ele quem vazou o documento.
Durante sua sustentação oral, Nascimento declarou que a imputação de crime por organização criminosa é arbitrária. Disse que seu cliente é o único réu das ações penais que investigam a tentativa de golpe que não é militar, do governo ou responsável por atos de mobilização das massas.
Para a defesa, como a linha do tempo da tentativa de golpe de Estado apresentada pela PGR não traz o nome de Rocha, ele deveria ser absolvido de todos os crimes. “Ele não aparece em nenhum ato, não foi em nenhuma reunião e não manteve interlocução com os demais núcleos”, disse.
O grupo foi denunciado por envolvimento em um plano para manter o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no poder depois da derrota nas urnas em 2022.
Os réus são:
Com a aceitação da denúncia pela 1ª Turma, em maio de 2025, eles passaram à condição de réus pelos crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. O relator da ação é o ministro Alexandre de Moraes.
Segundo a PGR, o grupo teria usado a estrutura da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) como aparato de contrainteligência para favorecer o plano de ruptura institucional.
Segundo a acusação, o policial federal Marcelo Bormevet, então na Abin, atuava como assessor do diretor-geral da agência à época, Alexandre Ramagem — deputado federal (PL-RJ) e já condenado no núcleo 1.
A Procuradoria afirma que Bormevet solicitou a Giancarlo Rodrigues, também da Abin, o uso do programa de espionagem First Mile para monitorar adversários e aliados do ex-presidente. O material levantado teria sido usado para alimentar “vetores de propagação” em redes sociais, como perfis falsos e contas cooptadas.
A PGR diz que os acusados chegaram a discutir o uso de softwares de espionagem contra o ministro Luís Roberto Barroso, do STF, mas recuaram por reconhecer a “ilicitude da ação”. Ainda assim, elaboraram e divulgaram conteúdos falsos sobre as urnas eletrônicas e sobre os ministros Barroso e Luiz Fux, para desacreditá-los e enfraquecer o processo eleitoral.
A Procuradoria aponta que o ex-ministro da Casa Civil, general Braga Netto, teria orientado o grupo a realizar “campanhas ofensivas” contra comandantes militares contrários ao golpe, rotulando-os como “traidores da pátria” e “alinhados ao comunismo”.
“O impacto das ações foi confirmado judicialmente pelas vítimas dos ataques, que resistiram à pressão até a transição democrática do poder”, afirma o órgão.
A PGR também atribui ao IVL (Instituto Voto Legal), comandado por Carlos Cesar Moretzsohn Rocha, a produção de um relatório “enviesado e manipulado” para sustentar alegações infundadas de fraude nas urnas eletrônicas.
O documento foi encomendado pelo PL (Partido Liberal) como parte de uma auditoria contratada junto ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral), mas teria sido usado para reforçar a tese de que o sistema eletrônico de votação era inseguro.
“Conhecedores da inviabilidade da pretensão, buscavam consolidar a mensagem de esgotamento das vias jurisdicionais para questionar o processo eleitoral”, diz a acusação.
A PGR sustenta que o grupo produzia e disseminava conteúdo falso de forma massiva — inclusive por meio de listas de transmissão em aplicativos de mensagens — para enfraquecer a confiança nas instituições e angariar apoio popular à ruptura institucional.