• Segunda-feira, 15 de setembro de 2025

LAI exige interpretação moderna, diz professor da USP

Coordenador do LabGov, Marcos Perez afirma que Estados e municípios melhoraram nível de acesso a informações públicas.

O professor de direito administrativo da Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo), Marcos Perez, avalia que a Lei de Acesso à Informação Pública precisa ser interpretada de forma moderna. A LAI, como é conhecida, tem quase 14 anos. Para ele, questões que não estão especificadas na legislação, como acessibilidade e experiência do usuário no meio digital, precisam ser consideradas pelos governos e entes públicos.

“O problema da transparência pública hoje não é um problema de lei, porque a Lei de Acesso à Informação já existe. O marco legal a gente já tem. Só que isso é o início da conversa. Há a necessidade de se agregar ao marco legal, boas práticas. Só a lei por si não dá conta. É preciso interpretar a lei de maneira mais moderna para ampliar as obrigações do poder público. […] Se eu me prendo à literalidade da lei, eu vou estar dando um alcance à lei menor do que ela tem”, disse o especialista ao Poder360.

Perez, que é também CEO do escritório Manesco Advogados, coordenou a elaboração do Ranking da Transparência Administrativa pelo LabGov (Laboratório de Governo), núcleo de estudos sobre políticas públicas, governança pública, transparência administrativa e governo da Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo).

A 2ª edição do estudo, a qual o Poder360 teve acesso, analisou os portais da transparência dos executivos federal, estaduais e das capitais no 2º semestre de 2023 e no 1º semestre de 2024. Leia a íntegra (PDF – 2MB).

“Quando a gente divulga o ranking, não fica só em cima da lei. Fazemos também uma interpretação para ampliar. Há alguns quesitos. Por exemplo: o site faz propaganda eleitoral? Então temos uma interpretação do que é isso e verificamos nos portais”, disse.

O estudo mostra que só 6 Estados e 5 capitais cumprem mais de 90% dos 44 quesitos considerados pelo levantamento. O Paraná lidera a lista. Sergipe fica em último lugar entre os governos estaduais. Porto Alegre (RS) é a capital mais bem avaliada no ranking. Já Rio Branco (AC) teve o pior desempenho.

Perez afirmou ser preciso extrapolar o que diz a lei para considerar aspectos mais sutis da relação do cidadão com os sistemas de busca por informação pública. O estudo levou em conta aspectos da experiência do cidadão ao buscar informações e o tempo que se leva para chegar.

A pesquisa avaliou não só a divulgação das informações, mas também a acessibilidade, como design e layout que tornem o acesso mais prático, rápido e intuitivo.

“Acessibilidade, portanto, implica não apenas na facilidade de acesso, como também a atualidade e inteligibilidade da informação, para além da possibilidade de download em diferentes formatos de modo a facilitar o tratamento dos dados”, diz o relatório do estudo.

Dois dos principais critérios foram o tempo gasto e o número de cliques necessários para se encontrar determinada informação. Caso os pesquisadores não conseguissem encontrar a informação desejada em até 3 minutos de pesquisa, poderia se considerar que o Portal da Transparência não foi bem-sucedido em fornecer aquela informação, e, portanto, não teria atendido a um critério específico.

“Isso não apenas ajudou a padronizar referências, como também reflete a realidade de quem costuma buscar por alguma informação em sites na internet, já que, na prática, poucas são as pessoas que perderiam mais tempo navegando em um site para localizar o dado em uma situação regular”, diz o estudo.

De acordo com o levantamento, a inspiração para se adotar tal parâmetro temporal foi o método usado no processo de renovação e modernização do Portal da Transparência da Câmara dos Deputados.

Perez afirmou que a administração pública no mundo e também no Brasil tem raízes autoritárias e, por mais que a Constituição e a legislação determinem o acesso à informação, ainda é difícil ter uma cultura nos governos de transparência.

“A administração não tinha o costume e nem era aparelhada para dar transparência que a Constituição determinava. Enquanto a lei não veio, não se fez nada. A Constituição não foi cumprida com a amplitude que ela tem. Quando a lei veio, as pessoas já estavam acostumadas com a clausura, com o regime mais fechado, mais protegido. Não se conformavam com o fato de ter que dar acesso à informação de maneira ampla”,disse.

Para o professor, rankings como o elaborado pela USP são importantes para incentivar que os entes públicos destinem mais orçamento e mais funcionários para os setores de transparência de cada ente público.

“Há vários estudos desse tipo Brasil afora. O nosso é um deles. E a importância é essa, tentar por meio do ranking incentivar que esses entes públicos destinem mais orçamento e que os servidores interpretem a lei de maneira mais moderna para que as coisas aconteçam”, disse.

Perez declarou que o uso de informações dos governos é fundamental para quem desenvolve políticas públicas: “É um dado que você pode comparar com outros países, por exemplo, e identificar problemas. De repente, se vê que gasta pouco com a Justiça, ou ao contrário, que se gasta muito. Acho que esse tipo de dado desmistifica alguns debates que se dão muito na superfície”.

Por: Poder360

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