• Quarta-feira, 2 de julho de 2025

Especialistas divergem sobre ação do governo no STF contra derrubada do IOF

Juristas citam riscos institucionais e conflito de interesses na tentativa do Planalto de restabelecer aumento tributário.

A decisão do governo de acionar o STF (Supremo Tribunal Federal) contra o decreto legislativo que derrubou o aumento do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) provocou reações distintas entre especialistas em direito constitucional ouvidos pelo Poder360. Enquanto uma parte vê a iniciativa como correta para preservar o equilíbrio entre os Poderes, a outra critica o movimento e alerta para riscos institucionais e para o papel da AGU (Advocacia-Geral da União).

Na ação protocolada nesta 3ª feira (1º.jul), a AGU argumenta que o Congresso violou a separação de Poderes ao sustar o decreto presidencial que elevava alíquotas do IOF. O governo alega que a prerrogativa de definir esse tipo de tributo é do Executivo e que a decisão legislativa causou insegurança jurídica e prejuízo à arrecadação federal.

Para o advogado, professor e sócio do escritório Streck e Trindade Advogados, Lenio Streck, o governo agiu de forma correta ao recorrer ao Supremo. Ele afirma que a derrubada do aumento configura uma tentativa do Congresso de usurpar prerrogativas do Executivo.

“Há flagrante inconstitucionalidade. O Legislativo tenta dar um drible no presidencialismo. Se a moda pega, o governo para de governar e o Legislativo assume no lugar, em matéria de atos regulatórios como o decreto sobre o IOF”, disse Streck.

Ele criticou a atuação do Congresso: “Querem transformar o sistema de governo em um ornitorrinco, aquele bicho que não se sabe se é pato ou porco. O Legislativo deveria fazer o que lhe cabe: leis. E estas, ele não faz como deveria”, declarou.

Já o advogado e professor André Marsiglia considera que o Supremo não deveria acolher o pedido do governo. Segundo ele, a AGU deveria defender interesses da União, e não do governo, e lembra que o Executivo até tem competência para alterar o IOF, mas não de forma irrestrita.

“Essa alteração não pode ter finalidade arrecadatória. Ao agir assim, o Congresso pode e deve sustar o decreto. O STF não pode funcionar como instância recursal das derrotas políticas do governo no Parlamento”, avaliou Marsiglia.

No Supremo, o ministro Alexandre de Moraes será o relator da ação da AGU. Ele já é o responsável por outras duas ações sobre o IOF: uma do PL (Partido Liberal), contra o decreto do governo, e outra do Psol (Partido Socialismo e Liberdade), contra a derrubada da medida. Tanto o governo, quanto o Psol pedem que o ministro dê uma decisão liminar pela manutenção do aumento do imposto. A decisão deverá ser validada pela Corte.

O advogado e sócio da Nimer Advogados, Carlos Nimer, avalia que é provável que a liminar seja concedida para o governo, mas que a discussão no Supremo seja jogada mais para frente. Há ainda a possibilidade de as ações se tornarem um processo de conciliação, nos moldes do que foi feito com as ações sobre emendas de congressistas, sob relatoria do ministro Flávio Dino.

A judicialização foi anunciada pelo ministro da AGU, Jorge Messias, nesta 3ª feira (1º.jul). Na prática, o governo quer que o STF diga que o aumento do IOF é responsabilidade do Executivo, portanto não poderia ter sido derrubado pelo Congresso.

Não é a 1ª vez que Lula vai ao Supremo por causa de questões relacionadas à arrecadação. Ele pediu em 2024 que a desoneração (isenção ou diminuição de benefícios) da folha de pagamentos a 17 setores empresariais fosse considerada inconstitucional. O impasse terminou em um acordo com o Congresso pelo fim gradual da desoneração.

A AGU é o órgão responsável por representar a União em ações na Justiça e presta consultoria jurídica ao governo federal. Em um resumo simplificado, é como se fosse o “advogado” do Executivo.

O governo Lula queria emplacar a alta no imposto financeiro para fortalecer a arrecadação, evitar mais bloqueios do Orçamento e assim cumprir o arcabouço fiscal. A Receita Federal estima que a alta do IOF traria R$ 12 bilhões para o Ministério da Fazenda de Fernando Haddad.

O Congresso e o empresariado reagiram contra a medida. A Câmara e o Senado decidiram derrubar o texto que aumentou o IOF na 4ª feira (25.jun). Na Casa Baixa, foram 383 votos a favor da revogação e 98 contra. Os partidos PT, PV, PC do B, Psol e Rede orientaram voto contra. União Brasil, PP, PSD, PDT, PSB, MDB e Republicanos, que têm 14 ministérios, votaram em peso a favor da proposta. A aprovação foi a pior derrota de Lula e Haddad na Câmara no atual governo.

Já no Senado, a votação foi simbólica –sem contagem nominal. Depois da votação, o presidente Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) disse que a decisão foi uma “derrota para o governo construída a várias mãos”.

Eis a cronologia do caso IOF:

 

Por: Poder360

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