• Quinta-feira, 18 de dezembro de 2025

Déficit de armazenagem redefine mercado de grãos do Brasil diante da expectativa de safra recorde

Crescimento acelerado da produção brasileira expõe gargalos logísticos, pressiona preços no pico da colheita e transforma a armazenagem de grãos em um dos principais ativos estratégicos do agronegócio

Crescimento acelerado da produção brasileira expõe gargalos logísticos, pressiona preços no pico da colheita e transforma a armazenagem de grãos em um dos principais ativos estratégicos do agronegócio A produção brasileira de grãos segue em trajetória de expansão acelerada e já ultrapassa 320 milhões de toneladas, com expectativa de um novo recorde no ciclo 2025/26. O avanço consolida o Brasil como uma potência agrícola global, mas também escancara um problema estrutural que vem se agravando safra após safra: a incapacidade da infraestrutura de armazenagem de grãos de acompanhar o ritmo da produção. Esse descompasso, longe de ser apenas operacional, tem efeitos diretos sobre a dinâmica do mercado físico, a formação de preços e a distribuição de margens ao longo da cadeia. Dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) indicam que a capacidade estática de armazenagem do país varia entre 200 e 230 milhões de toneladas, volume suficiente para estocar cerca de dois terços da produção anual. Na prática, isso significa que uma parcela relevante da safra precisa ser escoada rapidamente, justamente nos períodos de maior concentração de oferta, quando o produtor está mais exposto à pressão de preços.
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    Gargalo não é falta absoluta de espaço, mas de tempo Embora os números agregados sugiram uma certa suficiência, a realidade no campo é bem mais restritiva. A colheita brasileira se concentra em janelas curtas, especialmente entre março e junho, quando a soja entra em volume elevado e o milho avança logo na sequência. Nesse intervalo crítico, armazéns já ocupados, gargalos logísticos e limitações operacionais reduzem drasticamente a capacidade efetivamente disponível . window._taboola = window._taboola || []; _taboola.push({mode:'thumbnails-mid', container:'taboola-mid-article-thumbnails', placement:'Mid Article Thumbnails', target_type: 'mix'});Segundo Yedda Monteiro, analista de inteligência e estratégia da Biond Agro, o déficit de armazenagem não deve ser interpretado apenas como ausência física de silos. “A armazenagem representa tempo de decisão, e tempo é o ativo mais valioso no mercado de grãos. Quando a oferta entra de forma simultânea no sistema, quem não consegue esperar acaba vendendo sob pressão”, explica . Em regiões altamente produtivas, esse efeito é ainda mais intenso. Em determinados polos agrícolas, a relação entre capacidade de armazenagem e produção pode cair para 60% ou menos no pico da colheita, agravando a dependência do produtor em relação a cooperativas, tradings e grandes operadores . Concentração da armazenagem cria assimetria de poder Outro dado estrutural relevante é que cerca de 83% da capacidade de armazenagem brasileira está fora das propriedades rurais, concentrada em cooperativas, cerealistas, tradings e grandes grupos logísticos. Essa configuração cria uma assimetria de poder na cadeia, na qual o produtor, muitas vezes, não controla o momento ideal de venda e acaba absorvendo os custos da pressão sazonal de oferta . O diferencial de base vira o verdadeiro termômetro do mercado Nesse cenário, o chamado diferencial de base (basis) ganha protagonismo. Enquanto a Bolsa de Chicago (CBOT) reflete expectativas globais, política monetária e fluxos financeiros, é o basis que traduz a realidade local do mercado físico brasileiro. Elementos como volume disponível, logística, necessidade de caixa e capacidade de armazenagem se materializam diretamente nesse diferencial de preços . Em períodos de excesso de oferta, a deterioração da base funciona como um mecanismo de ajuste. No pico da colheita, esse desconto pode facilmente superar R$ 15 a R$ 25 por saca, enquanto o custo médio de armazenagem gira entre R$ 2,50 e R$ 4,00 por saca ao mês. A diferença evidencia como a venda forçada transfere margem ao longo da cadeia, penalizando quem não dispõe de estrutura própria . Armazenagem de grãos deixa de ser custo e vira ativo estratégico Com juros elevados e maior seletividade no crédito rural, a armazenagem também passa a ter um papel financeiro central. Ao reduzir a necessidade de vendas imediatas para geração de caixa, o produtor ganha flexibilidade para planejar a comercialização ao longo do ano, combinando vendas físicas, travas financeiras e operações de hedge . “A armazenagem não cria preço, mas define quem consegue esperar. Quem tem estrutura transforma um custo fixo em preservação de margem; quem não tem, paga esse custo todos os anos, mesmo sem perceber”, resume Yedda Monteiro . Desafio estrutural que redefine o jogo do agro Em um ambiente em que a produção cresce mais rápido do que a infraestrutura disponível, a armazenagem deixa de ser apenas um suporte operacional e se consolida como elemento central do gerenciamento de risco no agronegócio brasileiro. Controlar o tempo da venda passa a ser tão importante quanto produzir bem, especialmente em um mercado cada vez mais volátil e competitivo. O déficit de armazenagem, portanto, não é apenas um gargalo logístico: ele redefine o equilíbrio de forças no mercado de grãos, influencia preços, margens e decisões estratégicas, e tende a se tornar um dos principais temas do agro nacional diante da perspectiva de novas safras recordes .
    Por: Redação

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