A Nova Zelândia acaba de entrar no mapa das nações que decidiram olhar para os cogumelos mágicos com mais curiosidade científica do que medo moral. Anunciada na 4ª feira (18.jun.2025), a nova medida permite que a psilocibina (a substância psicodélica presente nos chamados cogumelos mágicos) seja prescrita em ambiente terapêutico.
Por enquanto, a porta se abriu só uma frestinha, apenas um psiquiatra, Cameron Lacey, professor da Universidade de Otago, recebeu o sinal verde para receitar a substância. Mas já é um início.
Lacey não é novato no assunto, já trabalhou com a substância em ensaios clínicos e, agora, atuará sob protocolos rígidos de monitoramento e registros. A substância continua sendo classificada como “não aprovada”, o equivalente a um “sim, mas com ressalvas”.
O responsável pelo anúncio foi o ministro associado da Saúde, David Seymour, que chamou a decisão de “um verdadeiro avanço” e deixou claro que o plano é, aos poucos, abrir inscrições para outros psiquiatras. Mas ninguém espere cogumelo na farmácia da esquina, o processo segue lento, cauteloso e cheio de papelada, como convém a uma substância que ainda provoca mais suspiros no Parlamento do que nas salas de terapia.
Num mesmo movimento, o país também decidiu facilitar o acesso à melatonina, sim, o hormônio do sono que já circula livremente em muitas prateleiras pelo mundo. Sinal de que o governo quer mesmo ajustar o compasso da saúde mental, incorporando abordagens menos convencionais, mas sem perder o controle da batuta.
No contexto global, a Nova Zelândia não está sozinha. A Austrália deu autorização semelhante em 2023. Na Suíça, sempre uns anos à frente, o uso terapêutico de LSD, MDMA e psilocibina é legalizado desde 2014. No Canadá, o uso médico é permitido em condições muito específicas. E nos Estados Unidos, onde a política de drogas é um mosaico em constante rearranjo, Estados como Oregon, Colorado e Novo México já liberaram o uso terapêutico em ambientes licenciados. Minnesota e Massachusetts vêm logo atrás.
Mas a história da Nova Zelândia tem um tempero local. Em Gisborne, a empresa Rua Bioscience liderou um estudo-piloto em parceria com uma comunidade Māori, usando extratos naturais de psilocibina no tratamento da dependência de metanfetamina. A iniciativa, chamada Tū Wairua, combina práticas culturais indígenas com metodologia científica, uma rara aliança entre tradição e inovação que começa a virar referência, em total consonância com o crescente envolvimento com as comunidades tradicionais, demanda do movimento psicodélico global.
As sessões envolvem preparação espiritual, aplicação clínica e integração comunitária, sob avaliação de pesquisadores da Rua e do Mātai Medical Research Institute. Agora, os resultados iniciais embasam o avanço para testes clínicos formais e também ajudam a dar corpo técnico à nova regulamentação.
Especialistas apontam a decisão como um marco real, um avanço que coloca o país numa rota alternativa para lidar com casos de depressão resistente. Uma opção terapêutica que nem tenta competir com antidepressivos tradicionais, mas oferece outra via, menos química, mais profunda e, por enquanto, muito mais controlada.
Com isso, a Nova Zelândia envia o recado de que psicodélicos não são moda, tampouco são motivo para pânico moral. Na verdade, quando bem utilizados, viram instrumentos terapêuticos com base científica. Agora, resta ver se outros profissionais vão pedir credenciamento, e se a experiência pode ser replicada sem cair no sempre risco de virar apenas uma caricatura do que poderia ter sido.