O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pretende enviar nos próximos dias ao Congresso um projeto de lei para regular a atuação das big techs no Brasil. O texto discutido na última semana determina a criação da Agência Nacional de Proteção de Dados e Serviços Digitais, uma nova estrutura reguladora que teria o poder de fiscalizar e sancionar as empresas. Uma das possibilidades incluídas no projeto é a suspensão provisória dos serviços por até 2 meses sem obrigatoriedade de decisão judicial.
A nova agência ficaria vinculada ao Ministério da Justiça e seria criada a partir de uma reformulação da ANPD (Autoridade Nacional de Proteção de Dados). O projeto estabelece que uma determinada rede que descumprir corriqueiramente regras para detectar e remover conteúdos ilegais que configurem crimes seja suspensa por 30 dias, com a possibilidade de prorrogação por igual período.
As plataformas seriam responsáveis por detectar e retirar com agilidade conteúdos ilícitos, que incluem também crimes contra o Estado democrático de Direito. No caso de descumprimento das regras reiteradas vezes, a Justiça poderia decidir por uma suspensão das atividades por mais de 60 dias.
O projeto determina ainda sanções financeiras, como aplicação de multas. Nesse caso, haveria um processo administrativo antes com possibilidade de defesa prévia por parte das empresas. As plataformas também serão obrigadas e ter representação legal no Brasil e disponibilizar um serviço de atendimento ao consumidor.
O projeto foi discutido por Lula em reunião com ministros no Palácio do Planalto na 4ª feira (13.ago.2025). A regulação das redes sociais é um dos temas que o petista tenta fazer avançar desde o início do seu 3º mandato, mas sempre encontrou resistência no Congresso.
O governo aproveita agora um momento considerado oportuno com a escalada da tensão na relação do Brasil com os Estados Unidos e com a disseminação de um vídeo do influenciador Felipe Bressanim Pereira, conhecido como Felca, sobre “adultização” de crianças. O vídeo foi publicado em 6 de agosto em seu canal no YouTube e tem mais de 43 milhões de visualizações.
O texto deverá ser analisado por um grupo de trabalho criado pelo presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), para debater mais de 60 projetos que tratam de regras mais rígidas para evitar a erotização de crianças na internet. Muitos desses projetos avançam em regras mais rígidas para a atuação das big techs.
Integrantes de partidos da oposição e de centro avaliam que o momento não é adequado para ampliar a discussão sobre a regulação das redes sociais no Brasil. Dizem que as propostas a serem analisadas pelo Congresso devem ser centradas apenas na questão da “adultização”.
Um dos motivos apontados é a tensão com os Estados Unidos. Em 9 de julho, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump (Partido Republicano, direita), publicou uma carta endereçada a Lula em que anunciava o aumento para a alíquota de 50% das tarifas cobradas dos produtos brasileiros importados.
Além de questões comerciais, o norte-americano incluiu na carta um trecho em que anunciou uma investigação por supostas práticas comerciais que estariam restringindo injustamente as exportações norte-americanas ao mercado brasileiro.
Justificou a medida aos “ataques contínuos” do Brasil às atividades comerciais digitais de empresas norte-americanas. Em outro trecho, disse que o STF (Supremo Tribunal Federal) viola a liberdade de expressão, com ordens de censura “secretas e ilegais” contra redes sociais norte-americanas.
Decisões do ministro Alexandre de Moraes levaram à remoção de conteúdos e à suspensão de perfis acusados de disseminar notícias falsas sobre o sistema eleitoral e de atacar a democracia. Empresas como X, YouTube e Meta foram afetadas.
Desde que Moraes entrou no radar das sanções previstas pela legislação norte-americana, deputados e senadores passaram a temer seus efeitos. Em 30 de julho, o Departamento do Tesouro dos EUA incluiu o ministro na lista de indivíduos sancionados pela Lei Magnitsky, que impõe sanções severas a bancos e corretoras que mantenham, entre seus clientes, pessoas ou entidades sancionadas.
A Casa Branca é crítica do modelo adotado pela União Europeia, onde as big techs foram obrigadas a tirar do ar 41,4 milhões de conteúdos no 1º semestre. O modelo brasileiro se baseia em regras do adotado pelos europeus. Por isso, congressistas avaliam que se a proposta avançar, pode haver um acirramento ainda maior com o governo de Donald Trump.