“Estamos desesperados com Netanyahu”, diz trabalhador humanitário
População faminta, hospitais lotados e sem medicamentos, milhares de crianças órfãs e ataques incessantes: horrores que nem todos mostram
Uma população faminta, hospitais lotados e sem medicamentos, milhares de crianças órfãs e ataques incessantes: em entrevista à , um trabalhador humanitário da Faixa de Gaza descreve os horrores que nem todos os meios de comunicação mostram. Segundo ele, a decisão do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, de tomar o controle da Cidade de Gaza aumenta ainda mais o desespero dos civis.
A crise humanitária na Faixa de Gaza, palco de uma campanha militar de Israel há 22 meses, atingiu “níveis inimagináveis”, denunciaram nesta terça-feira (12/8) vários países europeus, entre eles a França e o Reino Unido, além do Canadá e da Austrália. Riyad, palestino que trabalha para a ONG Ajuda Islâmica França, confirma a constatação. Segundo ele, não há comida ou água suficiente, nem medicamentos ou qualquer lugar seguro para se abrigar.
“Na Cidade de Gaza, há quase um milhão de habitantes. Todos foram deslocados para o Oeste, concentrados em apenas 10% a 15% do território urbano. As demais áreas foram esvaziadas e agora são ‘zonas vermelhas’, ocupadas pelo Exército israelense”, explica.
Desde o anúncio de Netanyahu, a população começa a se preparar para deixar os pontos ainda autorizados na capital do enclave. “Estamos tentando encontrar locais seguros, tudo está superlotado de pessoas deslocadas. Infelizmente, não há mais espaço. Esperamos que haja uma solução”, diz Riyad.
Israel nega que haja ‘fome generalizada’
Nesta terça-feira, o Cogat, órgão israelense encarregado da administração civil nos territórios palestinos e vinculado ao Ministério da Defesa, publicou um novo relatório afirmando não haver “nenhum sinal de desnutrição generalizada na Faixa de Gaza”. O Ministério da Saúde do enclave, controlado pelo grupo Hamas, aponta que nas últimas semanas 227 pessoas morreram de fome, entre elas 103 crianças.
No entanto, o Cogat alega que, em sua “análise detalhada”, há “uma diferença significativa” entre os números divulgados pelo grupo islâmico e os “casos documentados, com detalhes de identificação completos”. Para o órgão, a falta de informações “levanta dúvidas sobre a credibilidade” das mortes.
Mas, segundo Riyad, “Gaza vive a pior crise humanitária da sua história”. “Às vezes passamos dois dias, ou até mais, sem nos alimentar. Não há nada para comer”, ressalta.
O trabalhador humanitário afirma que entre os 8.400 caminhões de mantimentos que deveriam entrar no território nas duas últimas semanas, apenas 112 tiveram autorização de Israel para acessar o enclave. “90% dos caminhões que entraram foram atacados e saqueados. Nenhum caminhão chegou aos estoques e centros de distribuição oficiais da Agência da ONU de Assistência aos Refugiados Palestinos e do Programa Mundial de Alimentos”, diz.
Nos mercados ainda em funcionamento, os produtos são inacessíveis à maioria da população. Segundo ele, um quilo de farinha chega a custar o equivalente a R$ 315. “Não há mais leite para os bebês. Não há mais vitaminas. Não há mais alimentos que possam salvar as crianças em Gaza”, ressalta.
Riyad destaca que “pior do que encontrar comida é encontrar medicamentos”. Ele descreve hospitais e centros de saúde destruídos, superlotados e equipes médicas insuficientes. Além disso, a escassez de água potável obriga a população a aguardar na fila dos caminhões-tanque durante mais de uma hora. “Essa é a nossa rotina diária”, afirma.
Pressão para o fim da guerra
Nesta terça-feira, o Egito declarou que está trabalhando com o Catar e os Estados Unidos para tentar estabelecer um cessar-fogo de 60 dias na Faixa de Gaza. Segundo o ministro egípcio das Relações Exteriores, além da trégua, há também a proposta de troca de reféns israelenses por prisioneiros palestinos, “além do envio de ajuda humanitária e médica para Gaza, sem exigências ou impedimentos”.
Para Riyad, a população do enclave palestino está “desesperada com o silêncio internacional”. Segundo ele, a Faixa de Gaza precisa de um apoio “concreto”, além das palavras e anúncios. “Precisamos que se faça pressão para terminar essa guerra, essa catástrofe. Então esperamos que a comunidade internacional diga ‘basta’ ao massacre.”
Enquanto isso, aumenta o temor de que uma tragédia ainda maior ocorra se Netanyahu for adiante com sua decisão de ocupar totalmente a maior cidade do enclave palestino. “Para onde irão as pessoas? Israel vai destruir a Palestina, vai destruir a população”, reitera.
Apesar do cenário de desolação, Riyad diz que não tem outra opção além de seguir em frente. “Estou destruído por dentro, mas tento não demonstrar, porque é preciso ser forte para apoiar nossas famílias e a população. Há uma luta dentro de nós mesmos. Lutamos contra o sofrimento, lutamos contra a morte. É um combate pela vida.”
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Por: Metrópoles