
Cacique Álvaro Tucano diz que o local é habitado por indígenas antes mesmo da construção da capital federal - Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil
Ele lembra que o local é habitado por indígenas antes mesmo da construção da capital federal. “Não somos nós os invasores. Nunca fomos e jamais seremos”, acrescentou. A situação é bastante preocupante, segundo Álvaro Tucano. Ele diz que, por ser na capital do país, o caso representa um alerta sobre as muitas invasões de terras indígenas que têm ocorrido no país, “apesar dos avanços recentes que tivemos ao colocar uma indígena chefiando a Funai”, disse ele referindo-se à Fundação Nacional do Índio, presidida por Joenia Wapichana.“O Brasil nunca terá alma limpa tendo sangue sujo em suas mãos”, acrescentou.“O Brasil está violando direitos assegurados pela Constituição e acordos internacionais dos quais ele é signatário. Isso acontece não só aqui em Brasília. Sempre aconteceu em diversas outras regiões do país. Veja o caso dos yanomami. E também o dos pataxó na Bahia; com os guarani kaingang no Paraná. Veja a violência praticada contra os indígenas em Mato Grosso do Sul”, citou a liderança indígena.
Desocupação
Na terça-feira (15), PMs e indígenas entraram em confronto durante uma operação de desocupação de área pública localizada muito próxima às aldeias com integrantes de diversas etnias. A desocupação da área em Brasília foi determinada pela desembargadora Kátia Balbino, da 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Na decisão, ela autorizou a Agência de Desenvolvimento do Distrito Federal (Terracap), empresa pública voltada à gestão de terras no Distrito Federal, no sentido de que tomasse “providências para coibir novas ocupações irregulares na região e dar continuidade nas obras de infraestrutura do setor”.
Aldeia Santuário dos Pajés, em área ocupada por indígenas no Noroeste - Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil
Proximidade perigosa
Em entrevista à Agência Brasil nesta quarta-feira (16), Álvaro Tucano destacou que a área em questão, localizada na Quadra 707, está muito próxima às aldeias. Essa expansão urbana, explica o cacique, prejudicará as comunidades indígenas que vivem a poucos metros dali.Álvaro Tucano vive na aldeia Yepá Mahsã, um santuário voltado a atividades de pajés de diversas etnias. Ele explica que, das cinco principais aldeias da região, três já foram demarcadas: uma da etnia Kariri-Xocó, e uma Fulni-ô – além do santuário onde vive o povo Tucano. Ele acrescenta que uma outra aldeia, chamada de Bananal, ainda não foi demarcada apesar de existir antes mesmo da construção da capital do país.“Seremos prejudicados por causa de ganância e de especulação imobiliária. Por isso, há cerca de dois anos, alguns guajajara montaram acampamento nessa área que é uma espécie de fronteira de proteção de nossas aldeias”, explicou o cacique.
Confronto
A liderança criticou a forma como a PM chegou ao local para cumprir a determinação de dispersar os cerca de 20 indígenas que estavam ali. “Eu estava aqui e de repente me deparei com policiais jogando bombas, agindo acima da lei e dos direitos humanos.” Morando no local há 15 anos na aldeia Teko Haw, Zé Guajajara também vê com preocupação a urbanização das áreas próximas às comunidades indígenas. “Isso colocará em risco nossas famílias. Ficaremos muito vulneráveis, apenas para que empresas imobiliárias valorizem seus imóveis”, disse ele à Agência Brasil.
Zé Guajajara diz que a urbanização de áreas próximas às comunidades indígenas coloca as famílias em risco - Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil
Guajajara foi um dos indígenas que protestaram contra a chegada da PM na terça-feira. “Eu estava aqui com minha esposa, minha mãe e as crianças. De repente eles [PMs] chegaram já jogando bombas. Soltei então um alerta no nosso grupo de WhatsApp, e vieram outros [indígenas] para nos ajudar. Esse caso só reforça o quão importante é termos os limites de nossas áreas respeitados pelos não indígenas”, disse.Álvaro Tucano diz que são muitas as dificuldades de diálogo com o poder público. “Eu sou uma autoridade tribal e quero ser respeitado pelas autoridades brasileiras. Quem é mais brasileiro do que eu? Eles têm de me ouvir. Não podem machucar meus filhos nem meu povo. Quando não há acordo, se impõe a força por meio de decisões unilaterais e violentas. Foi isso o que a PM fez aqui.”“Nós sempre deixamos muito claro que não queremos ocupar a [área da quadra] 707. Apenas não queremos que ela seja ocupada por outros, para que não corramos riscos”, acrescentou Zé Guajajara.
Obras de infraestrutura
Na decisão apresentada pela desembargadora, autorizando a ação de apoio à Terracap, foi determinada a “proibição de novos ingressos de ocupantes indígenas na área [da quadra 707], além de garantir que se prossigam nas obras de infraestrutura locais”. A Terracap, então, acionou a Polícia Militar para garantir que a área pública se mantivesse desocupada. Ao chegar no local, a PM tentou negociar com indígenas que estavam nas proximidades “de um barraco não residencial que deveria ser demolido”. Foi estabelecido um prazo para o cumprimento voluntário, porém, não houve êxito no diálogo. Os manifestantes passaram a lançar pedras contra os policiais, impedindo a aproximação das equipes. "Eles também estavam munidos de arco e flecha, mas não os utilizaram”, informou a PM que, diante da resistência, acionou o Batalhão de Choque e Cavalaria. Segundo a PM, as equipes cumpriram a dispersão “com técnicas e equipamentos de controle de distúrbios civis”, mas, na sequência, os manifestantes teriam continuado a arremessar pedras contra as forças de segurança. De acordo com o chefe do núcleo de fiscalização da Terracap, Flávio Mendes, trata-se de uma área de aproximadamente 4 hectares destinada a um “projeto urbanista”. Segundo ele, “alguns indígenas estavam começando a ocupar o local com duas barracas para caracterizar posse”. Relacionadas

