Durante o mês alusivo "Dezembro Vermelho", campanha nacional de prevenção ao HIV/AIDS e Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs), a Câmara Municipal de Cuiabá intensifica ações de conscientização, debates e construção de políticas públicas voltadas à saúde e ao acolhimento dessa população. Em meio às atividades, histórias reais reforçam a importância da informação e do acesso aos serviços de prevenção e tratamento.
O enfermeiro cuiabano H.C descobriu o diagnóstico de HIV há cerca de seis anos. Ele contou como o desconhecimento e a negligência no momento da exposição foram decisivos.
“Eu sabia sobre as profilaxias pré e pós contato, mas quando a camisinha rasgou, não busquei atendimento. Achei que uma vez só não daria em nada, mas acabou acontecendo. O impacto emocional foi enorme”, lembra. Apesar do choque inicial, ele destaca a agilidade e o acolhimento da equipe do Serviço de Atenção Especializada (SAE). “O atendimento foi rápido, prestativo, sempre focado em oferecer o melhor. O mais difícil naquele início não foi o tratamento, mas o psicológico”, pontuou.
O apoio familiar também foi essencial para que o processo se tornasse menos doloroso.
“Minha família e os amigos mais próximos souberam da minha sorologia e me apoiaram desde o começo. Isso trouxe leveza e me fortaleceu para, inclusive, apoiar outras pessoas soropositivas que não tiveram o mesmo acolhimento”, relatou.
H.C afirma que nunca enfrentou preconceito em estabelecimentos, mas que ainda encontra resistência ao falar da sorologia em novos relacionamentos. “Mesmo com tanta informação disponível, ainda existe muita ignorância. Muita gente pensa como se estivéssemos nos anos 90”.
A campanha Dezembro Vermelho, segundo ele, precisa ser reforçada durante todo o ano.
“As pessoas ainda têm dificuldade em entender o que é o HIV hoje, como o tratamento é eficaz e como uma pessoa indetectável não transmite o vírus. Essa informação tem que ser contínua, não só em dezembro. Cuiabá ainda tem poucos pontos de coleta e tratamento. E muita gente nem sabe que as profilaxias de pré e pós contato com alguém infectado são oferecidas gratuitamente pelo SUS”, defendeu.
Lei municipal penaliza discriminação em estabelecimentos
Em Cuiabá, a Lei Municipal n° 4734 de 23 de Janeiro de 2005, altera a Lei 3.358, de 03 de agosto de 1.994, que estabelece penalidades aos estabelecimentos que discriminarem portadores do vírus HIV/AIDS.
A lei reforça a proteção dos direitos das pessoas vivendo com HIV e AIDS, proibindo qualquer forma de discriminação em estabelecimentos públicos e privados, incluindo comércio, escolas, creches, empresas e unidades de saúde. A nova atualização impede exigência de testes para admissão ou permanência no trabalho, veda a segregação no ambiente laboral, garante sigilo absoluto sobre prontuários e exames, e proíbe a recusa ou atraso de atendimento médico por motivo sorológico. A lei também estabelece penalidades que vão de advertência e multa à suspensão ou cassação do alvará de funcionamento de empresas reincidentes, assegurando que o município adote medidas firmes para proteger a dignidade e os direitos das pessoas vivendo com HIV.
Para H.C, a atuação do Poder Legislativo é um passo importante, mas ainda há muito a avançar. “Falar de HIV é falar de vida e de direitos. O preconceito, sim, é o verdadeiro inimigo. Quanto mais informação, acolhimento e políticas públicas tivermos, menos pessoas sofrerão com o estigma e mais terão acesso à prevenção e ao tratamento”, completou.
A falta de informação ainda é preocupante
O infectologista Luciano Corrêa Ribeiro garante que o maior desafio que enfrentamos hoje não é mais a falta de tratamento, mas sim a falta de informação.
“As pessoas precisam entender que o HIV é uma condição crônica controlável, e que a testagem deve ser vista como um cuidado de rotina, não como motivo de vergonha. Quanto mais naturalizamos esse processo, mais vidas conseguimos proteger”, reforçou.
Luciano alertou que o preconceito ainda é responsável por afastar muitas pessoas dos serviços de saúde. “O estigma continua sendo uma barreira enorme. Muita gente teme o julgamento social e adia o diagnóstico, o que prejudica o tratamento e mantém viva uma cadeia de transmissão que poderia ser facilmente interrompida. Por isso, é fundamental que a população saiba que ninguém está imune às ISTs e que buscar o teste é um ato de responsabilidade e autocuidado”, disse.
O especialista lembra ainda que os avanços da medicina oferecem segurança e qualidade de vida a quem vive com HIV e que a prevenção está cada vez mais acessível. “Hoje falamos de tratamentos modernos, com poucos efeitos colaterais, e de ferramentas como as profilaxias, disponíveis de forma gratuita pelo SUS. Uma pessoa com carga viral indetectável não transmite o vírus e isso muda completamente o cenário da doença. O que precisamos agora é derrubar tabus e garantir que informação correta chegue a todos os cuiabanos”, finalizou.
Ações garantem prevenção ao HIV e combate ao preconceito
A Prefeitura de Cuiabá, por meio da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), deu início às ações do Dezembro Vermelho, campanha nacional instituída pela Lei nº 13.504/2017. Durante todo o mês, as atividades serão voltadas à conscientização, prevenção e tratamento do HIV/AIDS e outras Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs), além do reforço ao combate ao estigma e à promoção dos direitos humanos.
Com o lema “A Vida Pede Cuidado”, a campanha deste ano busca ampliar o acesso à informação e fortalecer o acolhimento. Segundo dados nacionais divulgados na mobilização, cerca de 960 mil pessoas vivem com HIV no Brasil, das quais 95% recebem tratamento gratuito pelo SUS. Os números evidenciam que, com acompanhamento adequado, é possível viver com qualidade e manter a saúde estável.
A SMS reforça que a prevenção vai além do uso do preservativo – que continua sendo a forma mais eficaz de proteção simultânea contra HIV e outras infecções transmitidas sexualmente. A rede municipal disponibiliza uma estratégia completa de cuidado, incluindo:
- Preservativos masculinos e femininos: distribuídos gratuitamente nas unidades de saúde;
- Profilaxia Pré-Exposição (PreP): medicação tomada antes da exposição ao vírus, reduzindo em mais de 90% o risco de infecção;
- Profilaxia Pós-Exposição (PEP): tratamento de emergência que deve ser iniciado em até 72 horas após uma situação de risco;
- Prevenção vertical: acompanhamento e tratamento para gestantes, reduzindo o risco de transmissão para o bebê a quase zero.
Diagnóstico rápido: 30 minutos que salvam vidas
Um dos principais focos do Dezembro Vermelho, em Cuiabá, é incentivar a testagem regular. O diagnóstico precoce interrompe a cadeia de transmissão e garante início imediato do tratamento.
Os testes para HIV, Sífilis e Hepatites Virais estão disponíveis nas Unidades de Saúde da Família (USF) e no Serviço de Atendimento Especializado (SAE). A realização é:
- Rápida: resultado em até 30 minutos;
- Sigilosa: atendimento confidencial, podendo ser feito anonimamente;
- Acessível: não exige jejum, preparo prévio ou justificativa.
A campanha também reforça a diferença entre HIV (o vírus) e AIDS (estágio avançado da infecção). Graças aos avanços da medicina, o HIV é hoje uma condição crônica tratável. Um dos conceitos-chave é o I=I (Indetectável = Intransmissível), que significa que pessoas em tratamento regular e com carga viral indetectável não transmitem o vírus.
A SMS alerta para a urgência de combater o estigma, que muitas vezes afasta as pessoas do diagnóstico e do cuidado. Vale reforçar: HIV não é transmitido por abraços, beijos sociais, aperto de mão, suor, saliva, uso compartilhado de talheres ou banheiros.
Além do HIV, o Dezembro Vermelho chama atenção para outras infecções com tratamento garantido pelo SUS:
- Sífilis: tem cura, mas exige tratamento rápido;
- Hepatites Virais B e C: contam com vacina (no caso do tipo B) e terapias eficazes;
- HPV: prevenível por vacina disponível gratuitamente para adolescentes.
A secretária municipal de Saúde, Danielle Carmona, destaca que a campanha reforça o compromisso da gestão com o cuidado integral:
“Nosso maior objetivo é garantir que cada pessoa tenha acesso à informação, ao diagnóstico e ao tratamento, sem medo e sem preconceito. Prevenir é um ato de responsabilidade, mas também de amor. Estamos fortalecendo nossas ações para que toda a população se sinta acolhida e segura ao buscar os serviços de saúde.”
Procure a unidade de saúde mais próxima da sua casa para realizar o teste rápido ou retirar preservativos. Todos os atendimentos são gratuitos pelo SUS.





